Fim da gourmetização?
426 de janeiro de 2017 por Felipe Tavares
Recentemente li duas notícias do mercado gastronômico que me chocaram muito: o fechamento dos restaurantes Villa Roberti em BH e o da chef Roberta Sudbrack no Rio.
Não conhecia pessoalmente o da Roberta Sudbrack, mas não precisamos duvidar da grandeza da chef (e do local) já que ele esteve presente na lista do 50 Best Restaurants durante alguns anos e, em 2015, ela foi eleita como a melhor chef mulher da América Latina.
Já o Villa Roberti eu tinha uma relação mais próxima, conheço o proprietário que, inclusive já contribuiu aqui para o Indo pra Cozinha com este belíssimo texto “Abra um restaurante”. A casa ficava localizada num dos bairros mais nobres da capital, tinha uma estrutura e gestão invejáveis e esteve presente em todas as listas de melhores restaurantes enquanto esteve aberta.
Daí te pergunto, porque cargas d’agua duas casas deste porte fecham as portas?
Sabemos da crise econômica que vem assolando o país e seria muito óbvio e triste falar que a culpa foi dela. Estas casas eram comandadas por pessoas experientes, tinham fama – e conteúdo – e eram frequentadas por um público de alto nível.
Em uma entrevista, a chef Roberta Sudbrack fala:
“…Mas também acabei ficando inacessível, e não só pelo preço. Uma moça que esteve no restaurante me disse que tinha adorado tudo, mas que, quando estava se arrumando, morreu de medo por achar que se sentiria mal, desconfortável naquele ambiente. Imagine quanta gente não sentiu o mesmo.”
Será que atingimos o ápice da gourmetização e que o único caminho agora é ladeira abaixo? Leia aqui a goumertização não no sentido pejorativo que ela tomou, mas no verdadeiro: lugares e produtos exclusivos, luxo, glamour, etc.
Como temos visto diariamente, a busca pelo bom/limpo/justo está com força total. As pessoas querem comprar orgânicos da vendinha da esquina, o queijo que não tem marca, mas leva o nome do produtor, a cerveja especial que o amigo produziu na própria cozinha e por aí vai.
Não falo que este movimento vai extinguir os restaurantes de luxo do mercado, existe uma fatia de consumidores que tem e preferem este estilo. Mas o que tenho visto ultimamente são muito mais pessoas que vibram com a hortinha no fundo do quintal, com o cogumelo que nasceu na caixinha que comprou pela internet ou colhendo ovos da galinha que vive “solta” na roça.
Participei diretamente, pelo menos três vezes, da gestão de restaurantes e vou te dizer que é muito, muito difícil fazer uma casa de alto nível lucrar. Chega uma hora que você não tem mais forças e capital para continuar fazendo esta roda girar. A mão de obra é mais cara, você tem que trabalhar com produtos exclusivos, o ambiente deve ser decorado a altura do nível dos clientes e, infelizmente não é possível repassar todos estes custos para o valor dos pratos e bebidas.
Se é pela mudança do perfil do consumidor ou pela crise que estas e tantas outras casas estão fechando, eu não sei. Mas é fato que o mercado gastronômico está caminhando para outra direção, e ela é oposta ao gourmet. \o/
Abraços ainda chocados,
Felipe Tavares
Caro Felipe, seu texto é pertinente em vários pontos, também estou pensando como vc, porem o que vejo é um arrocho fiscal enorme, o que faz os custos serem elevados, a matéria prima de boa qualidade ainda é muita cara, sabemos que comprar produtos de procedência e com os devidos registros (o que significa empresa correta) não é barato, enfim vejo que muito mais que o luxo, glamour o que descordo de vc no texto é uma comida bem feita com ingredientes honestos, daí o que os grandes chefs estão fazendo buscando a informalidade dos serviços o que com certeza não tirará o glamour de quem procura como
No caso da citada Chef Roberta que vendendo sanduíches deve ter maior lucratividade. Ainda acho que o arrocho fiscal, taças, tarifas, impostos são os maiores vilões do setor! O que incentiva a informalidade e legalidade das empresas.
Parabéns pelo texto!!
Obrigado pelo comentário, chef!
Realmente a parte fiscal acaba levando embora o lucro de várias casas e acaba forçando a informalidade.
O importante é a qualidade dos produtos e a técnica de cada um para fazer o mais importante, comida boa!
Abraço!
Caro Felipe, acompanho de perto a vida de restaurantes a mais de dez anos posso te afirmar que existem muitos fatores que influem nessa alta taxa de fechamento.
O setor de “alta gastronomia” é sem dúvida uma aposta de alto risco. O espaço precisa ser bem montado, as comidas devem esta no ponto certo, a cada deve ser diferenciadas e ainda usar ingredientes caros. Mesmo fazendo tudo isso vemos muitos restaurantes de bom patamar com dias e mais dias de clientela exígua. Nos últimos 15 anos a mão de obra subiu muito de preço, os alugueis dispararam e a exigência decolou. Um micro erro é motivo para execrar publicamente um local. Somado a tudo isso o poder de compra da classe média foi massacrado, escolas, alugueis e etc subiram muito.
Os rico já não abrem vinhos que a quinze anos custavam R$ 800,00 que hoje custariam mais de 2000, hoje procuram quando muito um melhorzinho de 200, a classe média só vai ao restaurante para comemorar isso quando vai.
Sem contar toda a questão tributária, nosso estado prefere extorquir os estabelecimentos a vê-los progredir e geram empregos.
Verdade, Nicolas. Concordo muito com seu ponto de vista, nosso dinheiro está encolhendo!
Abs e obrigado pelo comentário!